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segunda-feira, fevereiro 21, 2005

Oficialização do Crioulo

Latuna, sempre com novidades sobre Cabo Verde, vem trazendo a público notícias acerca da possibilidade de oficialização do crioulo, o que muito me agrada, mas simultaneamente intriga.

O património linguístico em Cabo Verde é tão vasto e tão rico que não sei se haverá fôlego para o abraçar a um tão curto ou médio prazo, como o anunciado hoje pelo Ministro da Cultura.

"O Crioulo será a língua do ensino e da administração em Cabo Verde..."

Sim! Parece-me uma óptima ideia! Não me parece justo que o ensino se faça em português, quando muitos alunos do interior das ilhas só têm contacto com o português na Escola. Mas, não seria necessário antes da oficialização do crioulo uma preparação prévia do "terreno" para essa oficialização?

Há que criar a disciplina de crioulo nas escolas!... Mas, quem irá leccionar o crioulo? Todo o falante de uma determinada língua materna dispõe de instrumentos para a leccionar? E ainda antes desta questão não devemos ter um alfabeto que reuna unanimidade? Dicionários monolíngues e gramáticas com estudos linguísticos actuais. Tem de existir uma mobilização prévia dos linguísticas no sentido de conceber instrumentos de trabalho acerca da língua, para se proceder à sua aprendizagem e ao seu estudo nas Escolas de modo uniforme...

É certo que as regras da língua são concebidas pelos próprios falantes, o léxico da língua surge do seu uso quotidiano. Isto é, é a língua que faz a gramática e não os teóricos que fazem a língua; é a língua que faz o dicionário e não o contrário. Mas, ainda assim tendo leccionado por diversos anos em Cabo Verde justamente na área da linguística, conhecendo as realidades do crioulo em diversas ilhas, quer no sotavento, quer no barlavento, não imagino que estejam criadas as condições para a assunção definitiva do crioulo no ensino, de modo uniforme, rigoroso, homogéneo. Parece-me que isso implica vários congressos sobre o crioulo..., e sobretudo um aprofundamento da investigação linguística sobre o mesmo, em todas as ilhas.

Aproveitando o momento de reflexão governamental sobre a língua materna, e sobre o crioulo, deixaria a sugestão de um maior investimento na investigação linguística séria sobre o crioulo para que a partir de uma base real se concebam os instrumentos linguísticos, didácticos e pedagógicos adequados ao tratamento do crioulo nas salas de aula de todo o país. Para que esse ensino venha a ser um ensino qualificado, justo e igual para todos, tal como a língua crioula e os caboverdeanos merecem.